O olfato é especialmente poderoso na criação de memórias porque sua via neural é única em comparação aos outros sentidos. Diferentemente da visão, audição, tato e paladar, que primeiro passam pelo tálamo (o centro de retransmissão sensorial do cérebro), as informações olfativas seguem um caminho direto, sem filtragem inicial, indo da mucosa olfativa no nariz diretamente para o bulbo olfativo, que tem conexões íntimas e imediatas com o sistema límbico — mais especificamente, com a amígdala e o hipocampo, estruturas cerebrais fundamentais no processamento de emoções e na consolidação da memória (Herz, 2007; Gilbert, 2008).
Esse caminho direto explica por que os odores são tão potentes na evocação de memórias emocionais profundas e muitas vezes involuntárias — um fenômeno conhecido como efeito Proust, em referência ao escritor Marcel Proust, que descreveu como o cheiro de uma madeleine mergulhada no chá despertou nele uma série de memórias afetivas da infância, que estavam aparentemente esquecidas (Proust, 1913).
Na prática, isso significa que, quando sentimos um cheiro, o cérebro ativa simultaneamente regiões responsáveis tanto pela identificação do odor quanto pela evocação de memórias e pela ativação de respostas emocionais. Isso não ocorre da mesma forma com os sentidos visuais ou auditivos, cujas informações passam primeiro por processamentos racionais no córtex antes de acessar diretamente as estruturas emocionais (Herz, 2007).
Estudos neurocientíficos contemporâneos confirmam que o olfato não apenas está profundamente entrelaçado com a memória autobiográfica, mas também gera memórias mais vívidas, emocionais e resistentes ao esquecimento em comparação com memórias visuais ou auditivas (Herz & Schooler, 2002).
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Referências:
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HERZ, Rachel S. The Scent of Desire: Discovering Our Enigmatic Sense of Smell. New York: Harper, 2007.
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HERZ, R. S.; SCHOOLER, J. W. A naturalistic study of autobiographical memories evoked by olfactory and visual cues: testing the Proustian hypothesis. The American Journal of Psychology, v. 115, n. 1, p. 21–32, 2002.
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GILBERT, Avery. What the Nose Knows: The Science of Scent in Everyday Life. New York: Crown, 2008.
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PROUST, Marcel. À la recherche du temps perdu. Paris: Grasset, 1913.